O primeiro Presidente da República (Popular, na altura) de Angola, António Agostinho Neto, foi promovido, a título póstumo, ao grau militar de general do Exército, segundo decisão Conselho de Segurança Nacional divulgada hoje em Luanda.
De acordo com uma nota da Casa Civil do Presidente da República, a decisão foi tomada pelo Conselho de Segurança Nacional, que se reuniu em Luanda, sob orientação do Presidente da República e Comandante-Em-Chefe das Forças Armadas Angolanas, João Lourenço.
António Agostinho Neto, natural do Bengo (Angola), onde nasceu em 17 de Setembro de 1922, formou-se em medicina nas universidades de Lisboa e Coimbra e liderou (isto é como quem diz) a guerrilha do MPLA contra o colonialismo português.
Proclamou a independência angolana, pelo MPLA, em Luanda, em 11 de Novembro de 1975 em simultâneo com a proclamação feita, no Huambo, pela UNITA e pela FNLA, e faleceu em Moscovo, em 10 de Setembro de 1979, tendo subido ao poder em Angola José Eduardo dos Santos, que se manteve no cargo até 2017.
O Conselho de Segurança Nacional decidiu ainda passar à reforma, por limite de carreira, o general de exército Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, que durante a Presidência de José Eduardo dos Santos foi ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República.
De acordo com a mesma nota da Casa Civil do Presidente da República, João Lourenço, na reunião do Conselho de Segurança Nacional, e igualmente a título póstumo, foi elevado ao grau de general o tenente-general João José Afonso da Silva “Mayunga”, enquanto Plácido Ramiro da Costa, na mesma condição, ascendeu ao grau de brigadeiro.
Na mesma reunião foi aprovada a alteração de alguns postos na reforma de um grupo de oficiais superiores, como os casos do brigadeiro José Fernando “Khamisin”, promovido a general na reserva, de Mário António Sequeira de Carvalho, de tenente-general a general, Fernando Garcia Miala, de tenente-general a general, Miguel Samuel “Avestruz”, de brigadeiro a tenente-general, Muangala Soneca “Bolingó”, de coronel a tenente-general, e Luzia Bibiana de Almeida Sebastião “Gi”, de coronel a brigadeiro.
Embora sem adiantar mais pormenores, a Casa Civil informa que a reunião do Conselho de Segurança Nacional aprovou ainda o pacote legislativo relativo à Defesa Nacional, nomeadamente o Conceito Estratégico de Defesa Nacional, a Lei Geral do Serviço Militar, a Lei das Carreiras dos Militares, a Lei dos Postos e Distintivos Militares, a Lei das Condecorações Militares, a Lei da Programação Militar, o Livro Branco da Defesa Nacional e o estatuto orgânico da empresa pública SIMPORTEX.
Neto, o herói… mundial
Na sua qualidade de chefe do Estado-Maior da Região Militar Leste (RML), brigadeiro António Jorge dos Santos “Tojo”, enalteceu em15 de Setembro de 2016, no Luena, Moxico, a figura de António Agostinho Neto, pela contribuição na conquista da independência nacional.
Se ficasse por aqui (contributo para a conquista da independência), tudo estaria bem. Mas não. Como sempre, também os militares querem ser mais papistas do que o Papa.
Ao dissertar numa palestra sobre “Vida e obra de António Agostinho Neto”, por ocasião do 17 de Setembro, dia do único herói nacional reconhecido pelo regime, o brigadeiro António Jorge dos Santos “Tojo” considerou-o “figura de referência incontornável da história de Angola, quer do passado, quer do presente. Esqueceu-se do futuro.
O brigadeiro “Tojo” explicou que a vida e dimensão histórica de Agostinho Neto permanecerão para iluminar o caminho do país na senda da consolidação da paz, reconstrução e desenvolvimento económico e social. Será que o brigadeiro “Tojo” acredita mesmo no que diz?
Assim sendo, angolano de primeira que se preze nunca pode esquecer da heroicidade do agora também general do Exército, Agostinho Neto. Heroicidade que não inclui, obviamente, o seu papel de comandante dos massacres do 27 de Maio de 1977.
Palhaços uma vez, palhaços sempre
Em Setembro de 2009, o então ministro da Educação de Angola, Burity da Silva, afirmou que “a construção da angolanidade devia ser edificada com a participação de todas as culturas existentes, sem critérios estereotipados de exclusão”.
Prova dessa tese, segundo o regime, continua a ser a comemoração do Dia do Herói Nacional em homenagem, pois claro, a António Agostinho Neto.
Mas é assim. Se o MPLA é Angola e Angola é o MPLA, herói nacional há só um, Agostinho Neto e mais nenhum. Quando o MPLA for apenas um dos partidos do país e Angola for um verdadeiro Estado de Direito, então haverá outros heróis. Isto porque, pensa o comum dos mortais, nenhum partido tem a exclusividade dos heróis. Ou será que tem? Se perguntarmos a João Lourenço, é claro que a exclusividade é propriedade do MPLA.
Até lá, os angolanos continuarão sujeitos à lavagem do cérebro de modo a que julguem que António Agostinho Neto foi o único a dar um contributo na luta armada contra o colonialismo português e para a conquista da independência nacional.
Fruto da sua entrega à causa libertadora dos povos, o Zimbabué e a Namíbia ascenderam igualmente à independência, assim como contribuiu para o fim do Apartheid na África do Sul, esclarecem os donos do poder em Angola. Donos desde 1975.
Agostinho Neto foi também, segundo uma cartilha herdada do regime de partido único (hoje em termos práticos assim continua), “um esclarecido homem de cultura para quem as manifestações culturais tinham de ser antes de mais a expressão viva das aspirações dos oprimidos, arma para a denúncia dos opressores, instrumentos para a reconstrução da nova vida”.
Continuemos, contudo, a ver a lavagem cerebral que o regime do MPLA insiste em manter, isto porque terá informações dos seus serviços secretos que dizem que somos todos matumbos: “Dotado de um invulgar dinamismo e capacidade de trabalho, Agostinho Neto, até à hora do seu desaparecimento físico, foi incansável na sua participação pessoal para resolução de todos os problemas relacionados com a vida do partido, do povo e do Estado”.
Numa coisa a cartilha do MPLA tem toda a razão e actualidade: “como o marxistas-leninista convicto, Agostinho Neto reafirmou constantemente o papel dirigente do partido, a necessidade da sua estrutura orgânica e o fortalecimento ideológico, garantia segura para a criação e consolidação dos órgãos do poder popular, forma institucional da gestão dos destinos da Nação pelos operários e camponeses”.
É verdade também (segundo o MPLA) que foi graças a Agostinho Neto que Portugal aboliu a escravatura, que os rios começaram a correr para o mar, que o homem foi à Lua e que os europeus deixaram de viver na pré-história.
Também é claro (sempre segundo o MPLA) que Agostinho Neto nunca foi um ditador. Sobretudo depois de morto. Supostamente, Neto “foi eleito líder do MPLA pelos seus pares do Comité Director, quando uma facção defendia que o movimento devia fundir-se na UPA e os brancos e mestiços não podiam participar na luta armada. Neto triunfou! O líder de uma organização revolucionária que luta pela libertação do seu povo, não pode ser ditador. O libertador pode ser tudo, menos ditador!”
Mais. “Um Chefe de Estado que está quatro anos no poder e tem de lutar contra exércitos invasores e matilhas de mercenários, não tem tempo para ser ditador”.
Aliás, só mesmo um democrata, idealista, defensor dos direitos humanos e dos angolanos como era Agostinho Neto poderia ter ordenado – nesse 27 de Maio de 1977 – o massacre de milhares e milhares de angolanos, na sua esmagadora maioria militantes e simpatizantes do MPLA. Nenhum ditador seria capaz de tal façanha.